Por Daniela Giopato

O desenvolvimento desproporcional dos últimos 40 anos, provocado pelo crescimento de 524% do transporte rodoviário de cargas e apenas 40% da malha total rodoviária, mostra que o Brasil não priorizou investimentos nas estradas. A situação é agravada quando se observa que, em quatro décadas, algumas obras sequer saíram do papel, enquanto outras simplesmente foram iniciadas e jamais concluídas, caso da Rodovia Transamazônica, planejada durante o governo Médici, entre os anos de 1969 e 1974. Do total de 8 mil quilômetros previstos para ligar a região Nordeste e Norte do Brasil, além do Peru e Equador, apenas 4 mil quilômetros foram concluídos, e com trechos sem pavimentação, o que dificulta o tráfego pela região.

Para Neuto Gonçalves, a decadência da malha rodoviária gerou uma situação prejudicial a economia do País
Para Neuto Gonçalves, a decadência da malha rodoviária gerou uma situação prejudicial a economia do País

As taxas, contribuições e impostos criados para serem investidos em rodovias, tiveram parte dos tributos recolhidos aplicados em outros setores da economia, conforme comprovam dados da Confederação Nacional do Transporte &chaves1;CNT&chaves2;, que mostram que entre 2002 e 2009 foram arrecadados R$ 51,8 bilhões com a Contribuição Social e de Intervenção no Domínio Econômico &chaves1;CIDE&chaves2; dos quais apenas R$ 19,2 bilhões &chaves1;37,1%&chaves2; foram destinados ao setor de transportes. Além disso, os investimentos públicos caíram de 1,80% do Produto Interno Bruto &chaves1;PIB&chaves2; em 1975 para 0,1% em 1995, e fatos como esses trouxeram à tona a discussão em torno de um possível apagão logístico nos próximos anos.

O coordenador técnico da NTC&Logistica, Neuto Gonçalves dos Reis, informa que a falta de aplicação de recursos na infraestrutura, ocorrida principalmente entre 1991 e 2003, resultou no mau estado das rodovias brasileiras. Mesmo com o crescimento de 300% da malha pavimentada durante os últimos 40 anos – atualmente apenas 12,9% das rodovias pavimentadas -, a situação das estradas ainda prejudica o setor de transportes e causa impacto direto sobre o custo operacional dos caminhões. “A última pesquisa rodoviária da CNT &chaves1;2009&chaves2; revelou que 69% das rodovias estão em estado péssimo, ruim ou regular, e das rodovias operadas pelo poder público, apenas 22,4% são boas ou ótimas”, acrescenta Reis.

A concessão ajudou a melhorar a malha rodoviária e a reduzir os custos dos transportadores de carga
A concessão ajudou a melhorar a malha rodoviária e a reduzir os custos dos transportadores de carga

A decadência da malha rodoviária, conforme explica Neuto, gerou uma situação altamente prejudicial à economia do País, como aumento de 58% no consumo de combustível, elevação em até 50% dos índices de acidentes, acréscimos de até 38% nos custos operacionais dos veículos, aumento em até 100% nos tempos de viagem, elevação dos custos ambientais, pressão sobre a balança de pagamentos e esgotamento mais rápido das reservas de petróleo.

“O aumento dos investimentos em transportes nos últimos anos se deve, em parte, à criação do Programa de Aceleração do Crescimento &chaves1;PAC&chaves2;, em 2007, que previa inicialmente investimentos de R$ 33,4 bilhões em rodovias, sendo R$ 8,1 bilhões em 2007 e R$ 25,3 bilhões entre 2008 e 2011”, aponta Neuto. Em 2010, o governo lançou o PAC-2, com investimentos que incluem as obras não concluídas no PAC-1, e verba de R$ 50,4 bilhões em rodovias, sendo R$ 48,4 bilhões entre 2011 e 2014 e R$ 2,0 bilhões após 2014. As metas incluem a manutenção de 55 mil quilômetros e a construção de 7.989 quilômetros, além de projeto para se construir mais 12.636 quilômetros. Para cobrir o período de 2008 a 2023, o governo federal lançou o Plano Nacional de Logística e Transportes &chaves1;PNLT&chaves2;.

Na opinião de Moacyr Duarte o ganho de trafegar em rodovias concedidas é maior que o custo do pedágio, especialmente para caminhões
Na opinião de Moacyr Duarte o ganho de trafegar em rodovias concedidas é maior que o custo do pedágio, especialmente para caminhões

Dados como os do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada &chaves1;Ipea&chaves2; revelam que, com a iniciativa privada trazida pela concessão das rodovias e ferrovias, os investimentos totais cresceram de 0,38% do PIB em 1999 para 1,5% em 2008. Por outro lado, a pesquisa da CNT aponta que as estradas concedidas têm índice de aprovação de 76,5%, o que permite afirmar que, nos últimos 40 anos, a concessão das rodovias federais tem sido a solução mais eficaz para oferecer uma boa infraestrutura viária.

Em maio 1996, por meio da lei 9.227, foi permitida a delegação de rodovias da União para Estados, Distrito Federal e municípios, que poderiam explorar diretamente os trechos que lhe interessavam ou transferir a concessão para o setor privado, mediante concorrência pública. Porém, a primeira iniciativa de concessão de rodovias ocorreu em 1987, e o primeiro contrato de concessão foi o da Ponte Rio-Niterói, em 1994. Fazem parte da primeira fase de concessão das rodovias federais trechos como a Via Dutra, Rio-Teresópolis, Osório-Porto Alegre e Washington Luís, no trecho entre Juiz de Fora e Rio de Janeiro.

As rodovias concedidas são operadas com base em informações obtidas por imagens transmitidas em tempo real por câmeras de monitoramemto
As rodovias concedidas são operadas com base em informações obtidas por imagens transmitidas em tempo real por câmeras de monitoramemto

“É uma tendência mundial que os países transformem seus principais eixos rodoviários, com volume de tráfego significativo, em vias autossustentáveis que podem ser mantidas, operadas e melhoradas com os recursos obtidos pela cobrança de pedágio”, afirma Moacyr Duarte, presidente da Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias &chaves1;ABCR&chaves2;, formada por 52 empresas privadas em nove Estados do Brasil, que operam 14.993 quilômetros de rodovias, 7% da malha viária nacional pavimentada.

Desde a implantação das concessões, em 1996 até 2009, as concessionárias investiram R$ 19,13 bilhões, e as despesas operacionais atingiram R$ 17,96 bilhões. No período, foram recolhidos aos cofres públicos R$ 8,2 bilhões em impostos e taxas; os tributos federais somaram R$ 5,9 bilhões; e a título de Imposto Sobre Serviços &chaves1;ISS&chaves2; foram repassados R$ 2,3 bilhões aos 648 municípios por onde passam as rodovias concedidas.

“Além da melhoria nas condições das estradas, que reduz o custo dos transportadores de carga, diminui o tempo de viagem, garantindo mais segurança”, defende Moacyr Duarte. Ele diz ainda que os últimos dez anos foram marcados pela implementação de novas tecnologias para tornar mais eficiente a operação. “Se antes as rodovias eram operadas com base em informações via rádio, hoje são obtidas por imagens de alta qualidade, gravadas digitalmente e transmitidas em tempo real por câmeras de monitoramento instaladas na malha rodoviária”, acrescenta.

Outros benefícios da concessão foram, ainda de acordo com Duarte, a construção das novas vias e a melhoria do atendimento pré-hospitalar, que vem diminuindo as consequências dos acidentes com vítimas. Estudos viabilizados por entidades representativas dos transportadores de cargas mostram que o ganho ao trafegar em rodovias concedidas é maior que o custo do pedágio, especialmente para caminhões.

Em relação às ações que precisam ser feitas para melhorar a infraestrutura das estradas brasileiras e atender de maneira satisfatória o crescimento do transporte rodoviário de cargas, o presidente da ABCR destaca que um dos caminhos por parte da iniciativa privada são as Parcerias Público-Privadas &chaves1;PPPs&chaves2;; outros são por meio de subsídios do governo, do valor da tarifa de pedágio ou a concessão administrativa, pela qual o governo paga à concessionária pelo número de veículos que trafegam na rodovia, mas sem a cobrança da taxa do usuário.

Para Neuto Gonçalves dos Reis, espera-se que, apesar dos atrasos, os PACs sejam executados e que o PLNT, que resgatou do esquecimento o hábito de se planejar os transportes no País, não fique apenas no papel.

“A verdade é que, caso o governo não realize investimentos maciços na infraestrutura, especialmente nas rodovias, o transporte poderá se tornar o grande gargalo, capaz de impedir o crescimento econômico previsto para os próximos anos. O temido apagão logístico poderá chegar mais cedo do que se imagina”, finaliza.