Por Evilazio de Oliveira

Com a intenção de facilitar a renovação da frota brasileira de caminhões e demais implementos rodoviários, o governo federal liberou R$ 1 bilhão para o Procaminhoneiro, programa administrado pelo BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). As taxas anuais caíram de 13,5% para 4,5% (juros fixos até 31 de dezembro) e o prazo foi ampliado de 84 para 96 meses. Além da queda nos juros, o novo programa permite o financiamento de caminhões usados, com até 15 anos de fabricação, diferente dos oito anos permitidos anteriormente. Apesar de ser destinado a transportadores autônomos e pequenos frotistas, o Procaminhoneiro parece não ter convencido os estradeiros que, de um modo geral, se preocupam com as exigências burocráticas para a obtenção do financiamento e das altas prestações a serem pagas. Ao falar sobre o assunto em um dos programas semanais Café com o Presidente, Luiz Inácio Lula da Silva lembrou que essa redução nos juros e aumento na quantidade de prestações para financiamentos na compra de caminhões representa uma redução de 25% nos juros cobrados. “Você tem uma frota de caminhão velha transitando nas estradas brasileiras. Eles (os caminhões) gastam mais, ficam menos rentáveis para o proprietário e nós queríamos vender novos” – disse ele, ao destacar que a indústria automobilística havia caído, inclusive no setor de caminhões. Segundo o presidente Lula, “o que nós esperamos é que essas medidas possam dinamizar a indústria de caminhões e renovar a frota não apenas para as pequenas e médias empresas, mas, sobretudo, para os motoristas autônomos”. Nas estradas, o Procaminhoneiro é praticamente desconhecido. Ou visto como um tipo de negócio difícil de ser feito e, mesmo com a redução nas taxas de juros, difícil de ser pago.

Para Roque Rubenson, o plano só é bom para quem possui uns três ou quatro caminhões pagos e a rentabilidade possa ajudar no pagamento do veículo novo
Para Roque Rubenson, o plano só é bom para quem possui uns três ou quatro caminhões pagos e a rentabilidade possa ajudar no pagamento do veículo novo

Depois de muitos anos de estrada, Roque Rubenson Vilanova Lauer, 41 anos, conseguiu comprar três caminhões que estão no trecho. Parou de viajar e abriu uma borracharia no quilômetro 715 da BR-290, em Uruguaiana/RS, especializada em veículos pesados. Um dos caminhões atua no transporte de arroz do Uruguai e os outros no transporte nacional, viajando para o Centro do País. São dirigidos por dois filhos e um sobrinho. Roque conta que comprou o primeiro caminhão, um Mercedes-Benz ano 72, com dinheiro emprestado pelos amigos. Depois foi progredindo e trocando por modelos mais novos. Atualmente, ele paga as últimas mensalidades de um Scania ano 97, comprado através de consórcio. Acredita que este não é o momento certo para se comprar ou trocar de caminhão, mesmo por outro usado por causa dos baixos valores pagos pelo frete. Lembra que, apesar das vantagens dos juros baixos oferecidos pelo Procaminhoneiro, o valor de um caminhão equipado será muito alto e, mesmo com bastante prazo, as mensalidades também serão muito caras, praticamente inviáveis para a maioria dos carreteiros. Destaca que, em princípio, a pessoa não deve investir mais do que 30% dos seus rendimentos no pagamento de uma prestação ou compromisso financeiro. Todavia, ressalta, com os valores de um caminhão, carreta e o pagamento do seguro, o comprador vai comprometer praticamente 100% dos seus rendimentos. “Vai perder o caminhão em pouco tempo por não poder pagar as prestações”, acentua. Dessa forma, na opinião de Roque Lauer, o Procaminhoneiro somente será viável para o autônomo que já tenha uns três ou quatro caminhões pagos e cuja rentabilidade possa ajudar no pagamento do novo. Sacode a cabeça e reafirma que nem pensa em comprar outro caminhão: “afinal o faturamento no final do mês é o mesmo com o caminhão velho ou novo”.

Eleonor De Carli nunca se interessou pelos planos de financiamento, mas acredita que podem ser bons para os motoristas jovens, que tenham vontade de progredir na vida
Eleonor De Carli nunca se interessou pelos planos de financiamento, mas acredita que podem ser bons para os motoristas jovens, que tenham vontade de progredir na vida

Na opinião do estradeiro Claudimir Zelmer Fenner, 32 anos e oito de direção, a maioria dos bancos não se interessa em liberar financiamentos com dinheiro do BNDES, dificultando ao máximo com exigências de documentos e garantias. Natural de Roque Gonzáles/RS, Fenner dirige um Scania 89 no transporte internacional, preferencialmente para o Chile, mas admite que vai para onde o frete for mais compensador. Trabalha como empregado, com carteira assinada e comissão sobre o faturamento. Lembra que a tendência do ser humano é melhorar sempre, crescer, mas reconhece que os custos para a compra de um caminhão são altos e que, ao final de cada viagem, sobra muito pouco para o pagamento de uma prestação alta. Segundo ele, mesmo trabalhando como empregado acompanha de perto as despesas e o lucro obtido pelo patrão no final do mês. “Então, de que adianta o Procaminhoneiro financiar 100% do caminhão e da carreta se eu terei uma prestação de R$ 6 mil? Como é que eu vou pagar esse valor?” Além disso, também critica o excesso de burocracia por parte dos bancos e a quantidade de garantias solicitadas. Reafirma que os bancos não se interessam em repassar o dinheiro para os carreteiros, com as taxas de juros reduzidas. “É claro que eles querem emprestar com as taxas de mercado, com o dinheiro deles, mas daí, Deus nos livre”. Ou seja, com ou sem Procaminhoneiro, não dá nem pra sonhar com a compra de um caminhão, conforme o raciocínio do carreteiro Fenner.

Com poucas informações sobre o plano, Luiz Fernando Broglio acredita que o financiamento seja para veículos novos e esteja fora das possibilidades do autônomo
Com poucas informações sobre o plano, Luiz Fernando Broglio acredita que o financiamento seja para veículos novos e esteja fora das possibilidades do autônomo

O autônomo Eleonor De Carli tem 60 anos de idade e 25 de estrada. É natural de São Miguel do Oeste/SC, trabalhou como empregado e já foi dono de caminhão. Agora, depois de aposentado, voltou a trabalhar como empregado, “na maior tranquilidade”. Por isso, nem pensa na possibilidade de voltar a ter um caminhão próprio. Ele dirige um Iveco ano 2007 entre Garibaldi/RS, Uruguaiana/RS e Ariquemes/RO transportando madeira, manufaturados e polietileno para Nadir Michelle, empresário para o qual trabalha há 15 anos e do qual se orgulha de ser um grande amigo. De Carli conta que logo que se conheceram comprou um caminhão Volvo 88 do empresário, dono de uma madeireira em Garibaldi e da Norte Plastic, em Ariquemes. Com frete garantido, em pouco tempo pagou a dívida. E, quando se aposentou, vendeu o caminhão e continuou trabalhando como motorista para o amigo Nadir Michelle. Confessa que gosta muito da estrada e de caminhão, que foi com esse trabalho que conseguiu dar educação aos quatro filhos, todos formados. “Claro, com grande ajuda da mulher”, lembra sorrindo. Como não pretende comprar caminhão, nunca se interessou em saber o funcionamento dos planos de financiamento criados pelo governo. Acredita, no entanto, que podem ser bons para motoristas jovens, que tenham vontade de progredir na profissão e disposição para o trabalho. “Porque, sem muito trabalho, nada se consegue”.

Mauro Silveira dos Santos, 32 anos e 11 de profissão, é de São Luís Gonzaga/RS e dirige um Scania 93 no transporte internacional. Trabalha como empregado, mas como o sonho de ser dono de um caminhão é inerente a todo o estradeiro já andou “fuçando” por aí para ver se achava alguma coisa viável. “Mas não é fácil, te pedem mil e um documentos para fazer o cadastro”. Ele conta que esteve na Feira do Carreteiro, em Aparecida/SP e procurou informações de financiamento com bancos e montadoras, mas achou tudo muito complicado para o autônomo. “Na verdade, só empresas bem organizadas é que podem conseguir esses financiamentos, porque as prestações são altas e não dá pra pagar apenas com o serviço do caminhão”, salienta. Em princípio, o sonho de Mauro Silveira vai esperar mais um pouco, enquanto ele continua “fuçando” à procura de um bom negócio.

Para o estradeiro Luiz Fernando Broglio Cardoso, 30 anos de idade e quatro de profissão, a compra ou troca de caminhão nesta época é coisa para empresa grande e bem estruturada. Lembra que a situação do transporte está muito difícil, com poucas cargas, frete baixo, combustível e pedágios caros. Ele, que dirige um Volvo ano 93 na rota Brasil/Chile como empregado comissionado, só ouviu falar superficialmente do Procaminhoneiro e nem sabe direito como funciona. Acredita que seja um financiamento apenas para a compra de caminhões novos, de valores muito altos, longe das possibilidades de um “peão”, a começar pela aprovação do cadastro no banco. “E, se for aprovado e tudo der certo, o “peão” vai conseguir pagar as prestações?”, questiona