Por Elizabete Vasconcelos

Há muito tempo, o cadastro de motorista é uma polêmica no setor de transporte rodoviário de cargas, pois enquanto um grupo defende que se trata de uma medida extremamente necessária para a escolha do melhor profissional outro acredita que o cadastro é uma forma discriminatória para a seleção dos motoristas. Este assunto voltou à tona recentemente após os Ministérios Públicos dos Estados de Minas Gerais e de São Paulo terem proibido gerenciadoras de riscos de realizarem qualquer tipo de consulta. O “xis” da questão neste caso é a avaliação de aspectos creditícios do condutor, o que poderia fazer com que o mesmo não fosse selecionado para o transporte de determinada carga.

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É preciso ficar claro que a gerenciadora não impede ninguém de transportar, diz Cyro Buonavoglia, presidente da Gristec

O presidente da Associação Brasileira das Empresas de Gerenciamento de Riscos e de Tecnologia de Rastreamento e Monitoramento (Gristec), Cyro Buonavoglia, garante que este tipo de consulta não existe. “É preciso ficar claro que a gerenciadora não impede ninguém de transportar. Acontece que a avaliação do perfil do motorista segue os critérios de cada seguradora. É como quando você vai fazer um seguro para um automóvel, a seguradora analisa seu perfil e determina se fará ou não o seguro. A seguradora compra o risco de quem ela escolher. Os sindicatos afirmam que motoristas com dívidas ou cheques devolvidos são barrados na hora de carregar, mas isso não acontece”, afirma. Buonavoglia destaca ainda que o cadastro ajuda os bons profissionais. “Todo mundo quer contratar bons profissionais, por isso essa análise tem que deixar de ser vista como algo ruim”, complementa.

O cadastro é uma forma de colocar apenas os bons profissionais nas estradas, defende o carreteiro Luiz Alberto Libio
O cadastro é uma forma de colocar apenas os bons profissionais nas estradas, defende o carreteiro Luiz Alberto Libio

O motorista Luiz Alberto Moreira Libio, de 62 anos de idade, partilha da mesma opinião e diz que o cadastro deve existir. “É uma segurança para a transportadora, o cliente e para o próprio motorista. É um jeito de colocar apenas pessoas sérias na estrada, pois quem não trabalha direito não deve rodar”, argumenta o carreteiro, que está na atividade há pelo menos 40 anos.

O coronel Paulo Roberto de Souza defende que é preciso unificar o cadastro para partilhar informações entre todas as gerenciadoras de risco
O coronel Paulo Roberto de Souza defende que é preciso unificar o cadastro para partilhar informações entre todas as gerenciadoras de risco

Já o coronel Paulo Roberto de Souza, assessor técnico de segurança da NTC & Logística, embora acredite que o cadastro é algo bom para o setor, afirma que o modo como a consulta é feita deve mudar. “É preciso criar um cadastro unificado respeitando todos os termos de não invadir a privacidade do profissional. Hoje, cada gerenciadora tem um cadastro e isso faz com que o cadastro perca sua eficácia”, comenta.

Sobre este aspecto, Souza afirma que os transportadores – principalmente os que transportam carga fracionada – reclamam bastante. “Estes empresários carregam seus caminhões em diversas embarcadoras e muitas vezes cada uma tem uma gerenciadora de risco, por isso um motorista precisa ser avaliado por diversas gerenciadoras e cada uma tem critérios de avaliação diferentes”, exemplifica. Sobre a possível consulta de questões creditícias como critério para escolha do profissional, o coronel ressalta que há um projeto de lei no Senado que pretende proibir a consulta de cadastros de crédito como critério para contratação de um funcionário. “Não há porque existir isso”, defende.

É um absurdo o monte de consultas e às vezes não nos deixam carregar porque temos uma pequena dívida, reclama o motorista Cláudio Dias
É um absurdo o monte de consultas e às vezes não nos deixam carregar porque temos uma pequena dívida, reclama o motorista Cláudio Dias

O carreteiro Cláudio Dias, 36 anos de idade e 12 no trecho, considera absurda a existência deste tipo de consulta. “É absurdo este monte de consultas. Às vezes temos uma dívida de R$ 300 e por isso deixamos de carregar. O que se pensa? Que vamos desviar a carga para pagar nossas dívidas? O pior de tudo é que dizem que não estão nos proibindo de carregar, mas como você vai pegar um frete se a seguradora não quer fazer o seguro da carga? Não há como transportar desse jeito”, pondera o motorista que ocasionalmente viaja com a esposa e o filho. Diante das exigências do Ministério Público, Buonavoglia admite que pequenas mudanças possam vir a acontecer para que o cadastro não seja visto como vilão no setor. “Se for necessário poderemos formalizar que não haverá restrição a pessoas com pendências financeiras. Embora isso não exista hoje em dia, poderemos formalizar a questão. Até porque se formos impedir de trabalhar pessoas que tenham cheques devolvidos, por exemplo, o Brasil para”, analisa. O executivo reforça que todos os agentes do setor devem ter claro que a análise é “muito ampla e considera fatores como a experiência, idade, histórico profissionais e informações pessoais”. Além disso, segundo ele, a análise leva em consideração o conhecimento do carreteiro no trecho que será percorrido. “Se o motorista nunca atuou em uma determinada rota, como é que pode levar uma carga de alto valor agregado por uma estrada que nem conhece?”, exemplifica.

Questionado sobre a possibilidade das ações do Ministério Público gerarem o fim da consulta ao cadastro do motorista, o presidente da Gristec é incisivo. “Hoje, 15 seguradoras atuam no segmento. A concorrência faz com que o preço do seguro caia e isso se reflete no preço para o consumidor final. Se extinguirem o cadastro de motoristas, as seguradoras vão parar de atuar em um segmento que só lhe traria prejuízos e isso geraria muitos problemas”, finaliza.