Por Daniela Giopato

Em vigor desde o dia 15 de junho, a Lei 12.619, que regulamenta a profissão do motorista, acrescentou uma série de dispositivos na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e também no Código de Trânsito Brasileiro (CTB). As novas regras atingem tanto os autônomos quanto os empregados que trabalham em rodovia e vias públicas e urbanas, excluindo apenas os motoristas das zonas rurais. Para o presidente da NTC&Logística, Flavio Benatti, a lei é um novo marco para o transporte rodoviário de carga que, diferente de outros segmentos, não estava ainda regulamentado.

“Iniciamos o trabalho de desenvolver este projeto de lei com cada câmara técnica da NTC para elaborarmos um texto que desse um arcabouço jurídico e legal às empresas, beneficiando o empresário e o trabalhador”, explica. Por incluir mudanças no Código de Trânsito Brasileiro, Benatti acredita que a lei será positiva tanto para o autônomo quanto para o profissional com vínculo empregatício. “O serviço de motorista profissional está dentro da CLT e conta com deveres e direitos, como estar atento às condições de segurança do veículo, conduzir com perícia, prudência, zelo e observância aos princípios da direção segura. O benefício será de todos, principalmente da sociedade, que contará com motoristas descansados na estrada”, opina.

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Para o presidente da Fenacam, Diumar Bueno, não deveriam submeter o motorista de longos percursos às mesmas regras do urbano, que dorme todo dia em casa

O presidente da NTC & Logística se refere ao controle maior da jornada de trabalho, que está entre as principais alterações e talvez a que esteja causando mais polêmica e impacto entre transportadores, entidades e os próprios carreteiros. De acordo com as novas regras previstas no artigo 67-A do CTB, o motorista deve realizar um intervalo de onze horas entre um dia de viagem e outro (podendo fracionar 9 2) e fazer descansos de 30 minutos a cada quatro horas de direção. A infração é considerada grave, com multa de R$ 127,69. O principal objetivo dessa medida, conforme assessoria de comunicação social do Ministério das Cidades/Denatran é garantir a segurança no trânsito.

O grande problema, segundo o presidente da Fenacam – Federação Nacional dos Caminhoneiros Autônomos -, Diumar Bueno, é o fato de as rodovias brasileiras não possuírem locais adequados para o motorista parar e descansar após dirigir às 24 horas, conforme previsto na lei. Chama a atenção para um dos principais problemas enfrentados atualmente pelos carreteiros, o da falta de estacionamentos e áreas de descanso. “O motorista não tem opção de parada. Muitas vezes fica sujeito a ser assaltado além de ser submetido à condições climáticas severas. Não é fácil dormir dentro da cabine sob temperaturas muito frias ou quentes. Em quatro horas por exemplo, sob forte frio, a cabine congela”, declara

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A recomendação de especialistas é que o carreteiro durma em locais sem barulho, tranquilo e com pouca luz para ter um descanso com mais qualidade

Para Bueno, antes de efetivar o controle das horas trabalhadas deveria ter se pensado em oferecer infraestrutura para o carreteiro poder cumprir a lei, e não submeter o motorista de longos percursos às mesmas regras de um urbano, que finaliza o trabalho e pode dormir em casa todas as noites. “Há grandes chances de o estradeiro fazer mau uso dessas horas, buscar outros tipos de distração para passar o tempo e com isso comprometer a segurança nas estradas”, alerta.

Apesar das ressalvas, o presidente da Fenacam faz questão de destacar que a Federação é totalmente a favor da regulamentação, para a qual realmente era necessária disciplinar a profissão e trazer melhorias para todos que participam do transporte rodoviário. “As modificações são positivas para profissionalizar ainda mais a categoria e trazer mais segurança. Porém, é importante que as novas regras sejam adequadas e compatíveis à rotina do estradeiro que passa dias longe de casa e não tem locais adequados para poder descansar e fazer suas refeições”, explica.

O diretor do departamento de medicina ocupacional da Abramet – Associação Brasileira de Medicina de Tráfego -, Dr. Dirceu Rodrigues Alves Júnior, relata que as causas primordiais de acidentes nas rodovias brasileiras são fadiga 18% e sono 42%, perfazendo uma estatística de 60% de todos os acidentes, destacando que 93% são provocados pela falha humana. “Costumamos dizer que hoje, em todo acidente rodoviário tem um motorista profissional envolvido e que o motivo principal é o excesso de trabalho”, destaca.

O carreteiro, conforme cita Dr. Dirceu, necessita ter melhor qualidade de vida e não viver escravizado pelo trabalho. Atualmente, o motorista é submetido ao estresse físico pelo excesso de movimento; estresse psicológico, por medo de ser assaltado, ter a carga roubada, sequestrado e morto, além de estar exposto a ambientes com ruído, vibração, variações térmicas, gases, vapores, poeiras, entre outros. “Após quatro horas na direção veicular, esse profissional tem lapsos de atenção e com oito horas déficit de atenção. Nestas condições a possibilidade de acidente aumenta em duas vezes”, explica. Ele acrescenta ainda a questão da higiene do sono desse motorista, dormindo dentro da cabine ou na rede, sacrificando ainda mais o seu organismo. “Nossa recomendação é que o motorista durma pelo menos oito horas, em local sem barulho, sem trânsito de pessoas e com pouca ou nenhuma luz”, conclui.

De acordo com a Resolução nº 405 do Contran, de 12 de junho de 2012, a fiscalização do tempo de direção e do intervalo de descanso do motorista profissional poderá ser feito através de análise do disco ou fita diagrama do registrador instantâneo e inalterável de velocidade e tempo. Poderá ser feita também através de outros meios eletrônicos idôneos instalados no veículo e regulamentados pelo Contran. A verificação do diário de bordo, papeleta ou ficha de trabalho externo fornecida pelo empregador ou verificação da ficha de trabalho do autônomo, serão feitas quando não for possível comprovação através dos outros meios eletrônicos.

PRAZO DE ADAPTAÇÃO
As empresas terão prazo de 90 dias – contados a partir de 15 de junho – para se adequarem às novas regras trazidas pela Lei. Assim, até o dia 15 de setembro não haverá autuação e se aplicará a disposição da dupla visita, sendo a primeira de caráter orientativo. O Ministério do Trabalho e Emprego adotará o critério da dupla visita para fiscalização do cumprimento da nova Lei que deu nova redação aos artigos 235-A a 235-H e 71, parágrafo 5º, da CLT. As hipóteses de aplicação do critério da dupla visita estão previstas no artigo 23, do Decreto 4.552, de 27/12/2002, que aprova o Regulamento da Inspeção do Trabalho e no caso da publicação da Lei 12.619/2012 e se justifica em função do disposto no inciso I, que autoriza a adoção do referido critério quando ocorrer promulgação ou expedição de novas leis, regulamentos ou instruções ministeriais.