Por Evilazio de Oliveira

O vale-pedágio parece ser mais uma daquelas leis que não pegou, segundo opinião generalizada dos carreteiros que trafegam nas rodovias brasileiras. Criado em março de 2001 com a intenção de desonerar o carreteiro autônomo do pagamento do pedágio, era uma antiga reivindicação da categoria. Com a medida os embarcadores ou equiparados, passaram a ser responsáveis pelo pagamento antecipado do pedágio e fornecimento do respectivo comprovante ao transportador rodoviário.

Na tentativa de evitar fraudes contra os carreteiros, ficou proibido aos embarcadores fazerem o pagamento em dinheiro. São utilizados tíquetes ou cartões magnéticos de acordo com as necessidades de cada viagem. A fiscalização sobre o cumprimento da lei do vale-pedágio pode ser feita de forma direta ou por denúncias e, quando comprovada a infração, o embarcador é multado. Na estrada, a maioria dos motoristas de caminhão reclama do cumprimento dessa lei. Afirmam que apenas as grandes empresas, as melhores estruturadas, fornecem o vale-pedágio, enquanto, ao menos 70% delas, alegam que o valor está embutido no valor do frete. E para o carreteiro não perder a carga, acaba aceitando e pagando o pedágio do próprio bolso, prática que onera bastante o custo da viagem. Denúncias sobre eventuais irregularidades referentes ao vale-pedágio podem ser feitas para a ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) pelo e-mail [email protected] ou 0800-61-0300.

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Para o carreteiro Kleber Dantas empresa alguma paga o vale-pedágio para o motorista e quem reclama corre o risco de ficar sem carga

O carreteiro Kléber Dantas de Medeiros, de Natal/RN, tem 54 anos, 34 de profissão e viaja pelo Brasil inteiro. Garante que nenhuma empresa paga o vale-pedágio. “E se o peão reclamar perde a carga”, afirma. E como não dá pra ficar parado, é preciso se sujeitar. A alegação é sempre a mesma, “o valor do vale-pedágio está incluído no custo do frete”. Segundo ele, falta uma fiscalização rigorosa das autoridades para o cumprimento dessa lei que foi criada para beneficiar os carreteiros, conforme lembra.

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As empresas que não fornecem o vale-pedágio estão cometendo ilegalidade, porque esse dinheiro não pertence a elas, diz Frank Woodhead

Na opinião do vice-presidente de Logística do Setcergs (Sindicato das Empresas de Transporte de Cargas e Logística no Estado do Rio Grande do Sul), Frank Woodhead, 62 anos de idade e 40 no setor de transportes, “como em todas as atividades, sempre teremos os bons e os maus elementos”. Salienta, no entanto, que esse assunto não tem sido alvo de discussões ou denúncias no Sindicato, o “que não significa que não ocorram excessos”. A orientação, segundo destaca, é seguir as regras: “acertamos o frete, o roteiro, calculamos os pedágios e são emitidos os bônus”. Segundo ele, parte-se do princípio que toda a empresa organizada faça isso, que esse encargo que é cobrado do cliente seja repassado ao transportador. Afirma que as empresas que não fornecem o vale-pedágio estão cometendo uma ilegalidade porque esse dinheiro não lhes pertence e nem está sendo tributado. Acrescenta que a maioria, as empresas honestas e bem estruturadas, obedece a lei. Todavia, ao mesmo tempo em que se posiciona favorável ao vale-pedágio, critica a forma de cobrança, com dinheiro ou cartão. Considera um atraso. Explica que o caminhão precisa manter uma velocidade uniforme e ao parar e arrancar nas praças de pedágio ocorre um gasto excessivo de combustível, que acaba encarecendo ainda mais a viagem. Defende o uso de um chip no pára-brisa que efetue o pagamento automático sem a necessidade de parar o veículo. Conclui que cada situação exige soluções diferentes, mas que devem ser cobradas das autoridades.

Falta fiscalização das autoridades e união da categoria para fazer valer o direito de receber o vale-pedágio, afirma Valdir Fiori, que diz não ter esse problema
Falta fiscalização das autoridades e união da categoria para fazer valer o direito de receber o vale-pedágio, afirma Valdir Fiori, que diz não ter esse problema

Para o estradeiro Valdir Fiori, 52 anos e 31 de volante, as grandes empresas costumam ser rigorosas em todos os aspectos, a começar pelo caminhão, que deve estar com documentação e acessórios obrigatórios perfeitamente em dia. Quanto ao fornecimento do vale-pedágio, nem se fala. Natural de Barra Velha/SC e dono de uma carreta, ele viaja por todo o Brasil. Há cerca de seis meses transporta para a Bunge e está muito satisfeito. Recebeu um cartão que serve como vale-pedágio e como carta-frete. “A melhor coisa que existe”, afirma. Segundo ele, “falta fiscalização das autoridades e a união da categoria para fazer valer o direito de receberem o vale-pedágio, ao invés da desculpa esfarrapada que o valor está incluído no frete”.

Cerca de 70% das empresas costumam negar o vale-pedágio dizendo que já está embutido no valor do frete, opina o carreteiro Olvani Rafael Moro
Cerca de 70% das empresas costumam negar o vale-pedágio dizendo que já está embutido no valor do frete, opina o carreteiro Olvani Rafael Moro

Olvani Rafael Moro é natural de Guaraciaba/SC, tem 29 anos e 10 de profissão. Ele dirige uma carreta bitrem e viaja preferencialmente para o Mato Grosso e Rondônia transportando grãos e madeira. Acredita que pelo menos 70% das empresas costumam negar o pagamento do vale-pedágio, afirmando que o valor já consta no total do frete. Lembra que normalmente são as empresas maiores que fornecem os vales. Quando carrega para a Bertolini, por exemplo, recebe o cartão magnético do vale-pedágio, “que é uma beleza”. Ainda não utilizou o cartão da carta-frete, mas acredita que seja igualmente bom. “Enquanto isso é preciso dançar conforme a música, o que não dá é parar”, garante.

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Antônio Arcanjo critica a falta de fiscalização sobre o fornecimento do vale-pedágio pelas empresas e acredita na aplicação de multas para se cumprir a lei

Natural de São José do Rio Preto/SP, Antônio Arcanjo de Araújo, 48 anos de idade e 25 de direção, viaja pelo Brasil inteiro, utiliza o cartão Repon, que inclui o vale-pedágio e a carta-frete. Salienta que ainda são poucas as empresas que utilizam esse sistema de cartões, já que a maioria na verdade não paga o pedágio aos carreteiros. Segundo ele, com o preço do combustível e pedágio “caros pra caramba” e o frete barato, é preciso rodar muito pra conseguir pagar as contas no final do mês. Também critica a falta de fiscalização para o efetivo fornecimento do vale-pedágio pelas empresas. Acredita que depois de algumas multas, todas vão cumprir a lei.

No transporte de grãos, ao menos 90% das empresas não pagam vale-pedágio para os motoristas, diz o carreteiro Aldino Cazzanelli
No transporte de grãos, ao menos 90% das empresas não pagam vale-pedágio para os motoristas, diz o carreteiro Aldino Cazzanelli

Aldino Cazzanelli tem 70 anos e a mulher Venilda, 65. Estão casados há 45 anos, época em que ele foi para a estrada, trabalhar como motorista de caminhão. Ela foi junto. E hoje, às vésperas de comemorar as Bodas de Ouro (50 anos), ela continua firme, ao lado dele, cozinhando na caixa, lavando roupas, cuidando das finanças. Só parou quando nasceram os filhos e acompanhou o crescimento até uns sete ou oito anos. Depois as crianças ficaram com uma empregada, que os criou na verdade, e voltou para a estrada com o marido. Um dos filhos eles perderam em acidente, o outro é carreteiro igual ao pai. Viajam pelos Estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná. Com relação ao vale-pedágio, Aldino Cazzanelli considera que pelo menos 60% das empresas não paguem. Alegam que está embutido no valor do frete. No transporte de grãos, a coisa piora: 90% não pagam. Ressalta que as empresas paranaenses são as que melhor agem com os carreteiros. “Mas não são todas”, ressalta. Lembra que numa ocasião foi parado numa fiscalização, em Soledade/RS e como não tinha o comprovante do vale-pedágio, a empresa foi multada em R$ 560,00. “São poucas as empresas que obedecem a essa lei”, afirma.

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O cartão é abastecido pela empresa na qual tem seu caminhão agregado, mas o certo seria o dono da carga pagar o pedágio, diz Jackson Xavier Santiago

Natural de Vila Maria/RS, o carreteiro Jackson Xavier Santiago, 22 anos e dois de profissão, viaja como agregado com um caminhão trucado pelos Estados do Rio Grande do Sul, Paraná e Santa Catarina, transportando celulose e bobinas de papel. Explica que quando carrega fica acertado apenas o frete e o “dono do caminhão que se vire com o pedágio”. Todavia, existe a promessa que no ano que vem tudo será regularizado com a utilização de cartões para o vale-pedágio e carta-frete. Ele disse que tem cartão, que é abastecido pelo patrão e não pelo dono da carga, como considera que seria o certo.

Vale-pedágio não deve ser embutido no valor do frete, porque não pode ser declarado no Imposto de Renda como frete recebido, comenta Cláudio Ernesto
Vale-pedágio não deve ser embutido no valor do frete, porque não pode ser declarado no Imposto de Renda como frete recebido, comenta Cláudio Ernesto

O estradeiro Cláudio Ernesto Meinerz, 62 anos de idade e 42 de estrada, morador de Santana do Livramento/RS, transporta carga seca em todo o território nacional. Concorda que apenas algumas empresas fornecem o vale-pedágio, enquanto outras argumentam que o valor está embutido no valor do frete. Garante que isso é mentira, pois o frete é uma coisa e o vale pedágio é outra. Assim, não poderá declarar o valor do frete recebido ao Imposto de Renda, por exemplo, porque vai incluir o valor do pedágio. Acredita que o cartão para o vale-pedágio é vantajoso, desde que as empresas cumpram a lei. Ele é absolutamente contrário ao cartão para substituir a carta-frete, enumerando uma série de desvantagens, a começar pela falta de estrutura da maioria das transportadoras. Ou nas dificuldades em se achar um caixa eletrônico para retirar o dinheiro que precisa, sem falar no controle que o governo terá sobre esse dinheiro, ressalta