Por Evilazio Oliveira

Utilizada ainda de forma incipiente no Brasil, a logística reversa – aquela em que o produto faz o trajeto inverso ao da distribuição, voltando do consumidor ao fabricante, para uma destinação adequada do que sobrou – depende basicamente de leis ambientais rigorosas e uma grande participação da população. Embora a preocupação com o meio ambiente seja um assunto relativamente novo no País, vale lembrar iniciativas em pleno funcionamento, tais como a obrigatoriedade de recolhimento de pneus inservíveis e o de embalagens de produtos agrotóxicos utilizados nas lavouras.

Existem leis específicas para vários produtos, mas que deixam de serem cumpridas, como o descarte de produtos de informática, medicamentos, lâmpadas fluorescentes e tantos outros itens. Na maioria das cidades, a coleta do lixo seletivo não passa de uma ilusão e o que se vê são centenas de pessoas catando latinhas de cervejas e de refrigerantes para a venda, avulsa, em troca de alguns centavos.

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A necessidade de preservar o meio ambiente trouxe a preocupação com a reciclagem de materiais, lembra o engenheiro Eduardo Torres

O engenheiro químico e de processamento petroquímico Eduardo Mc Mannis Torres, 63 anos, diretor da Consult Ambiental, de Porto Alegre/RS (empresa da área ambiental com atuação em 12 Estados brasileiros e responsável pela manutenção do banco de regulamentação e leis ambientais de grandes empresas), lembra que até pouco tempo atrás não havia a preocupação com a logística reversa porque, de modo geral, o próprio consumidor cuidava do assunto.

“As garrafas de leite eram reutilizadas, assim como as de refrigerantes, de cervejas e muitas outras embalagens que podiam ser trocadas no mercado na hora da compra”, destaca Torres, acrescentado que hoje as coisas mudaram e a quantidade de lixo acumulado se multiplicou. Com isso – e com a necessidade da preservação ambiental – surgiu a preocupação que essas embalagens ou produtos, depois de terem cumprido a sua função, retornarem para os fabricantes para serem reciclados ou terem uma destinação final adequada, evitando a contaminação ambiental e a proliferação dos grandes lixões nos arredores das cidades.

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O volume de embalagens aumenta a cada ano devido ao aumento da produção e conscientização dos agricultores, explica Dione Kulman Nordon

Em sua opinião, a logística reversa tem funcionado bem no caso do recolhimento de pneus inservíveis e embalagens de defensivos agrícolas, latinhas de refrigerantes, papel e papelão, entre outros produtos. Com relação à possibilidade da logística reversa se tornar uma atividade rentável para o setor do transporte de cargas, Mc Mannis apenas sorri como resposta. Em Alegrete/RS – município conhecido pela extensa produção agropecuária – funciona uma unidade de recebimento de embalagens vazias de agrotóxicos utilizados nas lavouras da região e que este ano espera recolher cerca de 160 toneladas de vasilhames enviados por agricultores do município e de localidades próximas.

Essa central, inaugurada em julho de 2004, é mantida através de convênio entre a inpEV (Instituto Nacional de Processamento de Embalagens Vazias), Fundação Marona, Prefeitura de Alegrete e Arafo (Associação das Revendas de Agroquímicos da Fronteira Oeste). Ocupa um terreno com 10.390 m² com área construída de 370 m². Faz parte das 421 unidades existentes no País, integrantes do projeto de Logística Reversa das Embalagens Vazias de Agrotóxicos, composto por 308 postos de recebimento e 113 centrais, mantidos pelo Instituto e pelos fabricantes em parceria com órgão locais.

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Após 35 anos trabalhando como empregado, o carreteiro Benedito Carlo Cora é dono de oito caminhões, nos quais transporta pneus inservíveis

De acordo com Dione Kulmann Nardon, 28 anos e há sete na atividade, o volume de embalagens aumenta a cada ano em razão do aumento da produção agrícola e, também, pela melhor conscientização dos agricultores que enviam os recipientes de agrotóxicos para a destinação adequada, conforme a legislação. Ele é encarregado do recebimento, classificação e acondicionamento adequado das embalages usadas e posterior envio para incineração ou reciclagem em unidades específicas.

Nardon trabalha com os colegas Leonel Garcia Tadeu, 47 anos, e Araci Adroaldo Toledo, 44, no preparo das embalagens destinadas às usinas de reciclagem, de onde sai o material utilizado na fabricação de 17 tipos de produtos, incluindo caixas para descarga, cruzeta de poste e tubo de esgoto. Só podem atuar com a reciclagem dessas embalagens as empresas autorizadas pelo fabricante do agrotóxico ou por sua representante legal, a inpEV, salienta Dione Nardon. Explica que quando o volume de embalagens transformadas em fardos atingem os 13.500 quilos são despachadas em caminhões trucados para a reciclagem. Segundo ele, existe a preocupação em manter o produtor sempre bem orientado no sentido de lavar os recipientes vazios e entregá-los nos postos de coleta. Esse tipo de conscientização cresce a cada ano, afirma.

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O autônomo João Batista Wosni afirma que gosta de transportar cargas que não precisam de rastreador no caminhão e sem perigo de serem roubadas durante o trajeto

Segundo informe da inpEV, esse ciclo “ao contrário” – a volta da embalagem do consumidor para a indústria – chamado logística reversa, trata do retorno de bens pós-venda e pós- onsumo ao ciclo produtivo. Além do aplicável a vários tipos de embalagens, os setores de eletroeletrônicos, pneus, lâmpadas, entre outros, também requerem processos de logística reversa para promover a correta destinação final dos produtos após o esgotamento de sua vida útil.

Depois de 35 anos de estrada trabalhando como empregado, Benedito Carlo Corá, 60 anos de idade e 41 de volante, natural de Apucarana/PR e vivendo em Araucária, região metropolitana de Curitiba/PR, decidiu tornar-se empresário. E bem sucedido, embora continue na estrada. É dono de uma frota de oito caminhões carretas com baú e mantém outros 35 caminhões como agregados. Ele tem um contrato com a Anip (Associação Nacional dos Fabricantes de Pneumáticos) para o recolhimento de pneus velhos em municípios do Rio Grande do Sul. Já carregou no Mato Grosso, mas lembra que no Estado é cobrado ICMs dos pneus velhos, e não compensa.

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Claudir Valim usa caminhões pequenos para recolher sucatas nos centros urbanos e caminhões fretados para levar o material às empresas de reciclagem

Lembra que a obrigatoriedade de a carga ser transportada em caminhões baús e muitas vezes depender da boa vontade dos funcionários das prefeituras responsáveis pelos ecopontos, interrompe o carregamento dos pneus. Mas afirma que está sempre presente e ajudando e se for preciso contrata gente extra para auxiliar no trabalho, tudo para não atrasar as viagens. Benedito Carlo diz que gosta da atividade, nunca falta carga e o transporte não dá problemas. “O negócio vai muito bem”, reforça.

O estradeiro João Batista Wosni, 32 anos de idade e 14 de profissão, nascido em Itapevi/SP, atualmente morando em Curitiba/PR, dirige um Scania tem o seu próprio caminhão, mas na viagem em que conversou com a reportagem da Revista O Carreteiro estava com outro veículo transportando pneus inservíveis de ecopontos no Rio Grande do Sul a reciclagem em São Bernardo do Campo/SP. Ele costuma trabalhar como agregado nessa atividade e garante que gosta muito de “transportar pneus velhos, lixo, coisas que não dão problemas. Lembra que não precisa de rastreador, pois não há perigo de ser assaltado e viaja tranquilo. “O melhor tipo de carga que já transportou”, enfatiza.

O dono da Catito Reciclagem, de Uruguaiana/RS, Claudir Borges Valim é natural de Torres/RS, tem 56 anos de idade e há 23 anos compra e vende sucatas de ferro, alumínio e papelão. Uma área de 4.900 m² e com 20 funcionários é utilizada para a classificação dos diversos tipos de materiais, os quais são posteriormente despachados em caminhões para os centros de processamentos.

Ele compra de tudo, até latas vazias de azeite, portões de ferro, sucatas de carros, latinhas de refrigerantes, garrafas pet, papelão etc. Para o recolhimento desse material pela cidade e arredores são utilizados cinco caminhões pequenos, próprios. Para o transporte das sucatas para empresas de reciclagem Catito, como é conhecido, utiliza caminhões fretados, pois são bem bem mais em conta do que manter frota própria”, salienta.

Atualmente ele se ressente de uma redução na atividade, com clientes diminuindo o volume de compras ou dos valores a serem pagos. Tudo em razão da redução da atividade econômica, e até mesmo pelo clima, quando as pessoas deixam de consumir e as empresas, consequentemente, de produzir. “A sucata é o termômetro da atividade econômica”, ressalta. Ele informa que a sucata de ferro vai para a Siderúrgica Gerdau, em Sapucaia do Sul/RS.