Por  Daniela Giopato

Uma das principais queixas dos carreteiros é a falta de infraestrutura nas rodovias brasileiras. O dito popular “a casa do motorista é a estrada” vem abaixo quando os carreteiros descrevem os locais que são obrigados a parar para descanso, alimentação, esperar pela carga ou até mesmo passar a noite. Dormir e cozinhar no mesmo espaço onde ratos passeiam livremente, sem banheiro a disposição, segurança ou restaurante com higiene, e ainda ter de pagar pelo serviço são apenas algumas das dificuldades vivenciadas no dia a dia. Francisco dos Santos Souza, 56 anos de idade e 36 de profissão, 17 como autônomo, é de Periperi/PI, viaja o Brasil inteiro e carrega diversos tipos de carga. Na ocasião da reportagem, realizada em São Paulo, seu destino era Aracaju/SE, percurso de 2.300 quilômetros. Experiente no trecho, comentou da falta de estrutura das estradas do País para os motoristas de caminhão e também reclamou da falta de áreas de descanso ao longo das rodovias. “Os poucos locais que existem sempre estão lotados, ou então não oferecem estrutura para se passar uma noite com segurança”, destacou.

O autônomo Francisco dos Santos comenta que as estradas brasileiras estão despreparadas para atender o motorista de caminhão
O autônomo Francisco dos Santos comenta que as estradas brasileiras estão despreparadas para atender o motorista de caminhão

Conta que certa vez estacionou em uma rua no Rio de Janeiro e foi vítima de tentativa de furto. “Acordei e vi os rapazes passando com um estepe e depois mais um pneu, quando percebi que eram do meu caminhão gritei e eles fugiram. Dei sorte que eles não estavam armados”, lembrou. Na sua opinião, Curitiba é uma das poucas cidades que disponibilizam locais para abrigar o carreteiro que espera por carga ou que simplesmente faz uma pausa na viagem para relaxar ou se alimentar.

Ninguém pensa que o carreteiro também precisa ter um local para descansar, apesar de sua importância, reclama Valdemar Batista Nunes
Ninguém pensa que o carreteiro também precisa ter um local para descansar, apesar de sua importância, reclama Valdemar Batista Nunes

Em contrapartida, acrescenta que em Fortaleza existem postos de serviço que obrigam abastecer pelo menos 300 litros de diesel ou pagar pelos serviços disponibilizados para poder estacionar. “Pelo movimento de caminhões nas estradas, nossa classe deveria ser melhor assistida”, opina. “No Brasil não existe estrutura alguma para o carreteiro trabalhar”, desabafa o carreteiro Valdemar Batista Nunes, de São Paulo/SP, há 17 anos na profissão. Disse que já viajou por todo o País, mas atualmente faz apenas a rota São Paulo-Rio de Janeiro, porque o frete não compensa. “Apesar da nossa importância, ninguém pensa que precisamos ter um local para parar, aguardar uma carga, comer ou simplesmente descansar com segurança”, acrescenta.

É difícil encontrar um lugar com estrutura para receber a mulher, comenta a carreteira Amayara de Luna Pereira
É difícil encontrar um lugar com estrutura para receber a mulher, comenta a carreteira Amayara de Luna Pereira

Cita que no Rio de Janeiro, por exemplo, muitas vezes é necessário deixar o caminhão na rua durante a noite. Ele possui três caminhões e lembra que, em certa ocasião, um dos seus motoristas dormiu na frente de sua casa e foi assaltado. “Pagamos tanto pedágio que acredito ser possível essas empresas construírem áreas de descanso. Trabalhar com transporte está cada dia mais complicado, estou pensando em ficar com um caminhão apenas”, declarou.

É complicado depender da infraestrutura das estradas, uma saída é abastecer para ganhar o direito de pernoitar no posto, diz Roberto de Mesquita
É complicado depender da infraestrutura das estradas, uma saída é abastecer para ganhar o direito de pernoitar no posto, diz Roberto de Mesquita

Valdemar acredita que o motorista não se importa em pagar para usar a estrada, desde que tenha um local seguro, fechado e com o mínimo de estrutura para atendê-lo. Roberto Lima de Mesquita, 54 anos e 32 de profissão, de Varginha/MG, autônomo há poucos meses, costuma viajar para o Rio de Janeiro, Vitória e outras cidades; e tem opinião que trabalhar na estrada está se tornando uma tarefa cada dia mais complicada, afinal, além de todos os problemas já conhecidos existe ainda a falta de estacionamentos apropriados para caminhões.

Na opinião de Roi Weber, as concessionárias de rodovias cobram pedágio e por isso deveriam construir áreas de descanso para atender os motoristas
Na opinião de Roi Weber, as concessionárias de rodovias cobram pedágio e por isso deveriam construir áreas de descanso para atender os motoristas

Conta que a dificuldade é geral em quase todas as cidades brasileiras e que, atualmente, ou abastece para ganhar o direito de dormir no posto ou estaciona na rua e dorme de olhos abertos. “Recebemos tratamento desumano. Antigamente havia pelo menos o rádio PX e nos sentíamos mais unidos, mas agora, a tecnologia que entrou acabou limitando um pouco os nossos contatos”, comenta, lembrando que muitas vezes se passa a noite em locais sem banheiro próximo e o jeito é “encostar na roda”, brinca.

Rosenilton Pinheiro diz que já sentiu marginalizado e não como um profissional importante, ao passar a noite em estacionamento sem segurança e com ratos
Rosenilton Pinheiro diz que já sentiu marginalizado e não como um profissional importante, ao passar a noite em estacionamento sem segurança e com ratos

O também autônomo Roil Weber, 50 anos de idade e 33 de profissão, de Ijui/RS, conseguiu trocar o caminhão por um zero quilômetro no ano passado e assim como os colegas de profissão acredita que está cada vez mais difícil viajar com caminhão pelo Brasil, devido à falta de estrutura em relação às condições das rodovias e a falta de estacionamentos. Comenta que o trecho entre Curitiba e São Paulo é um dos piores, pois existem poucos lugares para parar, obrigando o motorista a dirigir cansado, o que pode resultar em um acidente. “As concessionárias apenas cobram o pedágio, mas poderiam construir áreas de descanso para o motorista preparar a sua comida e até pernoitar”, sugere. Diz que em uma de suas viagens no trecho citado aconteceu um acidente na Serra dos 90 (Serra do Cafezal, na BR 116, Regis Bittencourt) que provocou congestionamento e o consequente atraso.

Anoiteceu e ele teve de prosseguir até a cidade de São Paulo, por falta de um lugar seguro para pernoitar. “Continuei na estrada, mesmo cansado, e poderia ter provocado ou sofrido um acidente”, reclamou. Para Roil, o empresário que construir um estacionamento na BR 116 tem grandes chances de ganhar dinheiro. “Os carreteiros não ligam em pagar para poder parar com segurança. O motorista não pode se sentir mal na estrada”. Crítica. Lembra que certa vez estava na rodovia Marechal Rondon e os funcionários de um posto de pedágio não o deixaram utilizar o banheiro e ele tece de se virar de outro jeito. Rosenilton Pinheiro, 37 anos de idade é de Petrolina/PE, viaja o Brasil inteiro e carrega todos os tipos de cargas. Lembra de uma ocasião que passou a noite em um estacionamento próximo ao terminal de cargas Fernão Dias e se sentiu marginalizado e não como um profissional tão importante para o desenvolvimento do País. “Dormi junto dos ratos e sem qualquer segurança. Foi uma das piores noites da minha vida”, desabafa. “O que me deixa revoltado é que eu não estava passeando e sim trabalhando para o País, mas parece que ninguém se importa de que maneira um produto chega até um supermercado”, lamenta.

Rosenilton destaca que o problema acontece em todo o País e que o motorista tem que “se virar” para poder encontrar um local para poder parar o caminhão, descansar, fazer uma refeição, dormir ou até mesmo seguir viagem em segurança. Anayara de Luna Pereira, 31 anos de idade, viaja a cinco anos ao lado do marido João da Cruz, revezando na direção, o que ajuda a aumentar o faturamento no final do mês. Ela afirma que o preconceito e o desrespeito em relação à mulher ainda é muito grande. “Muitas empresas olham desconfiadas quando percebem minha presença. Liberam a minha entrada apenas quando comprovo que também sou motorista.

Além disso, ao longo das rodovias é difícil encontrar um lugar com estrutura adequada para receber a mulher. Geralmente os banheiros são imundos e os restaurantes, estes dispensam comentários”. Anayara diz que se sente constrangida e também indignada com o descaso do governo e da sociedade com a falta de importância dada aos motoristas de caminhão. “Na verdade nunca sabemos o que vamos encontrar na estrada. É estranho ter todo o conforto dentro de casa e ter de abrir mão para viver situações desumanas em nome de um trabalho tão importante para o País”, conclui.

5236tPONTO DE PARADA

Proprietários de uma rede de estacionamento para carros, Emerson Paffetti e Saulo Nicolat perceberam a carência de pontos de apoio para motoristas de caminhão e decidiram investir na construção de um estacionamento para veículos pesados. Trata-se do Garage Parking, local fechado que disponibiliza cerca de 200 vagas pavimentadas (em sistema rotativo) e serviços como segurança 24 horas, vestiários masculinos e femininos com banho quente, agências de cargas, restaurante e sala de jogos, além de oficina mecânica, loja de ferramentas, lava- rápido, farmácia, loja de roupas e lavanderia.

“O carreteiro encontra bastante dificuldade na estrada, principalmente em relação à infraestrutura. São profissionais carentes de locais como este”, explica Paffetti. De acordo com Nicolat, o estacionamento foi pensado para atender também a família do motorista e por isso conta com vestiários femininos e está nos planos a construção de uma brinquedoteca entreter os filhos dos estradeiros, O Garage Parking está localizados a 600 metros do Terminal de Cargas Fernão Dias e foi inaugurado no início desse ano e conta com algumas vagas cobertas.