Por Daniela Giopato

Com a meta de contribuir para renovação da frota através do financiamento de caminhões e implementos novos e usados, sistemas de rastreamento e seguro do bem, o Procaminhoneiro, do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), começou a operar em julho de 2006 e um ano depois ainda não convenceu os motoristas autônomos de que se trata de um bom negócio para eles. O programa atende exclusivamente o segmento de transporte rodoviário de cargas e por isso uma das exigências é que o interessado no crédito esteja inscrito no Registro Nacional de Transportadores Rodoviários de Carga (RNTRC).

Dados do BNDES apontam que entre julho de 2006 e julho de 2007 o programa liberou R$ 250 milhões em aprovações em cerca de 2.000 operações. Desse total, 50% foram negociados com os autônomos. Vale lembrar que pelo RNTRC o TAC – Transportador Autônomo de Cargas é proprietário ou co-proprietário de um veículo rodoviário de carga, podendo também dispor de veículos arrendados sob sua responsabilidade.

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Reginaldo Félix afirma ter medo de encarar um financiamento por conta das parcelas longas e valores altos

Montadoras como Ford, Iveco e Scania registraram números de vendas pelo programa relativamente baixos quando comparados ao total de veículos novos negociados. Nos cinco primeiros meses deste ano, do total de caminhões vendidos pela Ford, 25% foram via Finame e cerca de 10% – informou a montadora – se valeram do Procaminhoneiro. Já no mês de julho passado foram emplacados 1.646 unidades da montadora, sendo, aproximadamente, 40 delas adquiridas pelo programa, seguindo o percentual dos meses anteriores.

A Iveco, por sua vez, fechou 74 unidades no período de um ano através do programa. “O número baixo é justificado pelas condições oferecidas pelo Finame, que atraíram os motoristas autônomos. Mas, a partir de setembro a Iveco vai oferecer o Procaminhoneiro com alguns diferenciais”, afirma Alberto Mayer, diretor de relações externas da montadora.

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Aparecido Rodrigues conta que a idade do caminhão dificulta na hora de negociar um frete

 

A Scania obteve melhor resultado com o Procaminhoneiro. A montadora comercializou 250 unidades através da modalidade entre janeiro e junho de 2007. Comparado ao total de caminhões da marca vendidos no período – 3.494 unidades (pouco mais de 7%) – o número é pequeno.

As condições oferecidas pelo Procaminhoneiro, como financiamento de 100% do veículo, do seguro e rastreador, parcelas de 84 meses e taxa de juros fixa ou juros variável parecem não ter sido o suficientes para atrair os autônomos. Para Cláudio Leal, chefe de departamento de máquinas e equipamentos do BNDES, alguns profissionais ainda não perceberam os benefícios que a renovação de frota oferece no orçamento. “Estudo realizado por associação de transportadores mostrou que a redução na manutenção e com o combustível obtida compensa as temidas parcelas do financiamento”. Esse foi o pensamento que levou o autônomo Carlos Oliveira Filho, de Uruaçu/GO, 10 anos na estrada, a adquirir um Scania R420, 0km através do Procaminhoneiro.

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Na opinião de Sérgio da Costa hoje só consegue bom financiamento o carreteiro que tem mais de um caminhão

Conhecido no trecho como “Cegão”, Oliveira é dono de posto de combustível, porém passa maior parte do tempo na estrada. “Gosto mesmo é de estar na estrada. Do posto cuidam minha esposa e sobrinhos”. O valor total do novo caminhão mais o implemento ficou em R$ 410 mil, com 90% financiados em 60 meses. “Acredito que as parcelas vão ficar uma pouco mais de R$ 8 mil reais”, disse Oliveira na ocasião.

Quando questionado sobre o valor alto da parcela, ele explica que transporta para uma mineradora da região, e que recentemente conseguiu uma vaga que lhe garantirá frete por cinco anos. “Essa foi a grande razão para eu comprar o caminhão. Tenho carga garantida exatamente pelo período do financiamento”. Cegão tem outro caminhão, um Volkswagen 18.310, ano 2004, em nome da filha.

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Como autônomo, Marco Antônio conta que a situação apertou e que agora entende as dificuldades para trocar de caminhão

Enquanto as estatísticas trabalham com números satisfatórios e com poucos carreteiros com a mesma condição de Oliveira, tem autônomo vivendo uma outra realidade, na qual o lucro obtido com o frete não oferece segurança para encarar financiamento a longo prazo e valor alto das parcelas. O medo de entrar em uma dívida que pode perdurar até sete anos afasta os candidatos do sonho de trocar de caminhão e melhorar as condições de trabalho.

Reginaldo Félix de Moraes, São Paulo/SP, 56 anos de idade e 20 na estrada, faz a rota São Paulo-Bahia com seu Mercedes-Benz 1418, ano 92, e afirma não ter coragem de trocar de caminhão por ter de assumir parcelas longas e de valor muito alto. “Trabalhando duro consigo tirar líquido R$ 2.000,00 por mês. Como vou entrar em um financiamento onde a parcela vai superar ou ficar no limite do que eu ganho”, questiona. Além disso ele cita que após ter deixado de ser empregado para ter seu próprio caminhão as dívidas aumentaram. Reginaldo atribui a situação ao frete que, segundo ele, é o mesmo há 10 anos. “Recebo sempre propostas de financiamento, e apesar de todas as exigências por parte das transportadoras tenho que manter os pés nos chão e tocar a vida”.

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Pedro Xavier acredita que financiamento é apenas para os carreteiros mais novos que têm coragem de se arriscar

Conhecido no trecho como Ronaldinho, o autônomo Aparecido Rodrigues, 38 de idade e 10 de profissão, de São Paulo/SP, viaja para o Nordeste e conta que algumas vezes tem dificuldades para negociar um frete, devido a idade do seu caminhão ano 94. Os planos futuros de Aparecido incluem troca do caminhão, porém, ainda vai levar algum tempo, afinal falta um ano e quatro meses para terminar de quitar o atual caminhão. “O valor que recebemos pelo frete mal dá para a manutenção do bruto e o sustento da família. Os juros oferecidos hoje são muito altos, sem falar dos financiamentos que exigem que o caminhão saia com seguro. Aí fica ainda mais caro”, reclama.

Há anos na rota São Paulo- Chile, Sérgio da Costa Ferreira, de Uruguaiana/RS, 23 anos de profissão, diz não enfrentar preconceitos por conta da idade do seu caminhão, um Mercedes-Benz 1113, 1975, apesar de saber que no Brasil as transportadoras aceitam veículos com 10 anos de uso no máximo. “No Chile, como há pouco caminhão a procura é grande e a minha dificuldade é de conseguir frete quando chego em São Paulo. Chego a ficar até uma semana parado e às vezes quando aparece uma carga perco o frete por causa do ano do caminhão”.

Sérgio conta que consegue tirar R$ 2.500,00 líquidos e não tem condições de assumir parcelas tão longas e com juros altos. “Eu sempre digo que só consegue financiamento o autônomo que tem mais de um caminhão”. Apesar de todas as dificuldades, Sérgio afirma que está juntando dinheiro, e também conta com ajuda da família para trocar o caminhão até fevereiro de 2008. “É melhor dever para parente do que para banco”, sugere.

Para continuar na estrada como autônomo, Marcos Antônio Faedo, de Curitibanos/SC, 37 anos de idade e 19 de profissão, comprou um GMC 16.220, ano 2000. Apesar de ainda faltar 43 parcelas para quitar, Marcos afirma que conseguiu um bom financiamento com valores razoáveis, já que optou por um caminhão considerado fora de linha e financiou R$ 45.000,00.

Como autônomo, Marcos sentiu algumas mudanças em relação ao tempo em que era empregado. “A situação ficou apertada, pois meu faturamento gira em torno de R$ 3.000,00 e com esse dinheiro tenho que pagar a prestação, fazer a manutenção e sustentar a família. Agora eu entendo a dificuldade que o autônomo tem para trocar de caminhão”.

Com 35 anos de estrada, Pedro Xavier, de Ipatinga/MG, tem opinião de que hoje financiamento é apenas para os mais novos, que têm coragem de se arriscar. Apesar do seu Scania 112H, ser ano 89, e estar um pouco fora do padrão exigido pelas transportadoras, Pedro afirma que nunca teve grandes problemas por conta da idade do caminhão. “Claro que enfrento dificuldades, mas não tenho mais idade para tentar trocar por outro veículo mais novo. Os juros são altos e as parcelas longas demais. Hoje estou tranqüilo com o meu caminhão quitado”, comemora.