Por João Geraldo

Qualquer pessoa que está há mais de uma década no negócio do transporte rodoviário de cargas tem condições de avaliar o quanto o caminhão evoluiu nos últimos anos. O salto tecnológico facilitou a vida dos motoristas e donos de frotas, mostrou um universo novo para a atividade motivado pelo próprio mercado, ao exigir veículos mais efi cientes e econômicos e com maior segurança, entre outros itens. E as novidades aparecem e tomam conta do mercado após serem desenvolvidas, na maioria das vezes, em parcerias entre fabricantes de autopeças e sistemas e montadoras de caminhões, com participação de potenciais clientes no processo, com opiniões, sugestões e testes do produtos em desenvolvimento.

Este caminho acaba de ser trilhado pela Eaton – fabricante mundial de caixas de transmissões para veículos pesados, entre outros produtos e sistemas para a indústria automotiva e aérea – e os seus profi ssionais da área de desenvolvimento, para colocar no mercado e emplacar mais um produto para o transporte. Trata-se de uma caixa de câmbio automatizada denominada Hybrid, uma transmissão híbrida de seis velocidades que incorpora um motor elétrico de 65cv e um sistema eletrônico que opera em conjunto com o veículo e o motor mecânico.

Afinal, qual a vantagem de ter uma caixa de câmbio com um motor elétrico que agrega cerca de 130 quilos a mais no caminhão? A principal delas é a redução do consumo de combustível, pois o motor elétrico passa a operar só ou em conjunto com o mecânico em determinadas situações, e ao fi nal de um período de trabalho se traduz em economia. Além disso, motor elétrico reduz as emissões veiculares.

Isso é possível porque a transmissão é equipada com um módulo eletrônico que integra o mapa dos dois motores e passa a gerenciálos através de parâmetros para escolher qual é a melhor opção, se elétrica ou mecânica, para mover o veículo. No caso de haver necessidade de velocidade máxima e desempenho, os dois motores trabalham juntos e combinados.

Posicionado entre a saída da embreagem e a entrada automatizada da transmissão, o motor elétrico pesa em torno de 125 quilos e tem a capacidade de se autorecarregar com o caminhão em movimento. Atualmente existem 117 veículos rodando nos Estados Unidos com a caixa Hybrid, sendo que 93 deles trabalham para a FedEx, enquanto os outros 24 operam em outras empresas. No geral, a frota híbrida opera há mais de dois anos nos Estados Unidos.

Ricardo Dantas, diretor comercial da Eaton, divisão de transmissões sediada em Valinhos/ SP, explica que a partir do uso da caixa híbrida a FedEx substituiu os caminhões equipados com motor de seis cilindros para quatro e obteve ganho de potência e redução no consumo de combustível. A caixa híbrida desenvolvida pela Eaton usa o sistema que os técnicos da empresa chamam de paralelo, por isso promove a soma das potências dos dois motores quando necessárias.

De acordo com Dantas, esta característica foi fundamental para a FedEx reduzir o tamanho dos motores diesel de sua frota de seis para quatro cilindros com a transmissão Hybrid. Ainda segundo o executivo brasileiro, a empresa norte-americana tem registro de economia de 50% no consumo de diesel operando em circuito misto (urbano e rodoviário). Os veículos são montados em chassi Freigthliner e equipados com motor Mercedes- Benz OM 904.

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Outras aplicações da caixa híbrida, testadas com sucesso pela Eaton nos Estados Unidos, referem-se aos caminhões de serviço, utilizados – por exemplo – por empresas que operam em serviços como manutenção em redes de energia elétrica. Nestas e outras aplicações que exigem movimentação de equipamentos, o motor elétrico ocupa o lugar do motor mecânico. Os veículos em testes nestas operações apresentaram economia de consumo na faixa entre 40 e 60%. “A Eaton tem certeza de que a transmissão Hybrid é um bom produto para o mercado, tanto é que já existe a encomenda de 100 unidades de caminhões International 4.300 (modelo médio) para serem entregues no quarto trimestre deste ano “, acrescentou Dantas.

Para Rodrigo Meirelles, gerente de planejamento de produto, brasileiro que trabalha no centro de pesquisas e desenvolvimento da Eaton, em Galesburg, é no caminhão de serviço que se percebe mais rapidamente o ganho com o uso da caixa híbrida. Para quem dirige o veículo é imperceptível a atuação do sistema híbrido fazendo o serviço do motor a diesel, conforme se pôde comprovar na pista do campo de provas da Eaton, em Marshall, próximo a Galesburg, ambas as cidades no Estado norte-americano de Michigan.

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Ainda sem escala de produção, o Hybrid custa hoje cerca de 40% do preço de um caminhão, estimado em pouco mais de 100 mil dólares no mercado norte-americano. Porém, o valor acaba embutido no preço final do caminhão, porque a Eaton entrega o equipamento para a montadora. “A previsão é que num período entre cinco e sete anos possamos reduzir o valor do equipamento para 20% do valor do veículo”, explica Meirelles, apesar de que a empresa estuda uma forma de tornar mais viável a aquisição do produto. As baterias do sistema elétrico da caixa têm durabilidade prevista para 12 anos, mas a proposta no momento da venda do veículo é que substitua o sistema a cada seis anos. Hoje, o custo estimado para a troca é 4.500 dólares.

A caixa híbrida acena com um futuro promissor nos Estados Unidos, um mercado onde 90% dos caminhões médios utilizam caixas automáticas ou automatizadas. Porém, o Brasil também está na rota do equipamento. Ricardo Dantas reforça que as prefeituras têm interesse no equipamento, principalmente devido às vantagens econômicas ao ganho ambiental. Os frotistas brasileiros também estão na mira da empresa, para o futuro. Neste aspecto, Dantas adiantou que deverá apresentar uma caixa Hybrid no Congresso SAE Brasil, no início de novembro. Além disso, a meta é ter um veículo em teste no País, como já ocorre na China.

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Caminhão de serviço usado para testes pela Eaton

A Eaton investiu dezenas de milhões de dólares no projeto, o qual teve início há 15 anos, época em que a empresa trabalhava no desenvolvimento de veículos elétricos. Keith Wright, gerente planejamento de produto e automação (da divisão de caminhões médios) lembra que ao chegar à conclusão que os veículos elétricos não seriam o futuro, a empresa mudou de direção e aproveitou a tecnologia desenvolvida até o momento para outros produtos, como o sistema híbrido.

* O jornalista João Geraldo viajou aos EUA a convite da Eaton – Divisão de Transmissões, localizada em Valinhos/SP.