O aumento constante do diesel está provocando impacto direto na rotina dos caminhoneiros. A falta de previsibilidade em relação ao preço de um dos maiores custos do transporte, e a defasagem do frete, tem comprometido de modo bastante prejudicial a renda dos motoristas autônomos que dizem estar cada dia mais desanimados com a profissão.

Desde o início deste ano já foram aplicados quatro aumentos no valor do diesel totalizando um aumento de mais de 28%. O último reajuste foi de 5% o que significou acréscimo de R$ 0,13 elevando para R$ 2,71 o preço final do litro.

Planilha de Custos Foto Claiton Dornelles BBC Fotografias 33

Em comunicado, a Petrobras explicou que mantém os seus preços alinhados aos do mercado internacional, o que, segundo a estatal, “é fundamental para garantir que o mercado brasileiro siga sendo suprido sem riscos de desabastecimento pelos diferentes atores responsáveis pelo atendimento às diversas regiões brasileiras”.

Na tentativa de amenizar os impactos provocados pelos constantes reajustes, o Governo Federal editou decreto para zerar os impostos (PIS/Cofins) incidentes sobre a comercialização e a importação do óleo diesel. Para alguns especialistas, a medida não soluciona o problema já que os tributos federais respondem por uma parcela pequena e, assim, o consumidor não vai sentir muita diferença. A medida entre em vigor imediatamente e tem validade entre março e abril.

Como os tributos federais respondem por uma parcela pequena, o consumidor não deverá sentir muita diferença com a isenção confirmada dia 1 de março. No caso do diesel, PIS e Cofins correspondiam a R$ 0,33 por litro, e será esse o impacto no preço ao consumidor caso as distribuidoras e revendedoras repassem integralmente o desconto. A Cide (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico) já estava zerada.

Para o presidente da CNT (Confederação Nacional dos Transportadores), Vander Costa, a frequência de aumento do óleo diesel traz prejuízo para o transportador e autônomo. “Entre o aumento e a negociação existe um prazo, a maioria das empresas no contrato já tem o repasse automático. Mas até enviar uma carta pedindo o repasse e receber o valor já se passaram 15 dias. Quando você está equilibrando o preço já ocorre outro aumento”.

Costa ressalta que a CNT defende a Petrobras deve ter autonomia de gestão e pratique o preço do mercado internacional. Destaca ainda, que em pesquisa foi percebido que o preço do diesel no Brasil não é o mais caro do mundo. Na América do Sul, por exemplo, somente o Paraguai tem o preço mais barato e é questão de centavos. “Portanto o Brasil está em sintonia do valor praticado no mundo inteiro. O importante é manter uma previsibilidade para poder equilibrar o preço do diesel a cada três meses”, afirmou.

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Como alternativa para baixar o valor do diesel, a CNT sugeriu ao Governo Federal a CNT a redução do nível de biodiesel no óleo diesel comercializado no Brasil. Se essa redução for na ordem de 50%, ou mais, haverá alívio imediato sobre o preço do combustível. Atualmente, o biodiesel compõe 13% do diesel comercial e a redução não vai acarretar aumento da emissão de gases poluentes.

O assessor executivo da CNTA (Confederação Nacional dos Transportadores Autônomos), Marlon Maues, lembra que o impacto no transporte rodoviário de carga é direto, pois o diesel é o insumo básico da operação, acarretando um aumento direto no valor do frete e por consequência, no custo Brasil. “O caminhoneiro autônomo também sofre o impacto diretamente pois muitas vezes não realiza os cálculos corretos do custo do seu frete e acaba comprometendo seus ganhos por não repassar os aumentos aos seus clientes”, explicou.

Sergio Marques
É complicado fazer qualquer estimativa de custo da viagem, porque o diesel tem preço diferente em cada região, comenta o autônomo Sérgio Marques de Almeida

É o que relatou o autônomo Sergio Marques de Almeida, 49 anos de idade e 30 de profissão, de Petrópolis/RJ. Ele disse estar sem qualquer ânimo para continuar na profissão. Afirmou ser complicado lidar com o aumento constante do diesel sem o frete acompanhar. “Fica impossível fazer qualquer estimativa de cálculo de uma viagem, pois o preço do diesel é diferente em cada região do País. Quando você faz conta percebe que não vale a pena. O valor líquido recebido mal dá para fazer uma revisão decente no caminhão para viajarmos com segurança”, ressaltou.

Para tentar driblar esse aumento e tentar melhorar o ganho, Sergio decidiu trabalhar a maior parte das viagens com cargas leves. Seu caminhão tem capacidade para transportar 15 toneladas, ele mas procura carregar somente a metade. “Assim,  o desempenho do caminhão atinge 3,5 km/litro e ocorre menor desgaste do sistema de freio e dos pneus entre outros componentes.

Com todos esses aumentos, afirma que está cada vez mais difícil de obter um lucro significativo nas viagens. “Se eu subo do Rio de Janeiro para o Alagoas recebo o valor bruto de R$ 6.500,00 no final do meu frete. Por estar com uma carga leve consigo ter líquido o valor de R$ 3.000. Porém, nunca tenho certeza se vou ter carga de retorno e na maioria das vezes  não consigo uma carga leve. Assim, aquela média de 3,5 km/litro cai para 2,9 km/litro e o valor líquido cai para R$ 2.400. E quando retornamos de uma viagem dessas é necessário fazer uma revisão, o que me custa metade do valor líquido recebido”, desabafou.

Por todos esses motivos, Sérgio não está muito animado com o futuro da profissão. Garante que esses aumentos constantes do diesel estão afetando o lucro do caminhoneiro. “Fica complicado trabalhar com essa instabilidade. São muitos custos. Até os restaurantes de estrada aumentaram significativamente o valor, nos forçando a ter que investir em uma caixa cozinha”, destacou.

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O diesel deveria ter um valor mais razoável. É complicado trabalhar assim, pois só a troca de óleo do meu caminhão custa 600 reais, lamenta Hamilton Lemos

O autônomo Hamilton Lemos dos Santos, 55 anos de idade e 20 anos de profissão, também afirmou ter dificuldades com a alta do diesel. “Esses aumentos nunca foram tão frequentes. E o diesel é um produto que puxa muitas outras coisas, por isso deveria ter um valor mais razoável. Quando ele sofre um reajuste, a carne, o arroz, e outros produtos que os brasileiros consomem aumentam também. Essa situação precisa ser revista pelo governo, pois prejudica todo mundo”, opinou.

Em relação aos impactos das altas do diesel provocados no seu dia a dia, Hamilton também destaca o descompasso entre o frete – defasado há muitos anos – e os aumentos de preço do diesel. “Como fazer uma manutenção correta no caminhão, troca de óleo, que no meu caminhão custa R$ 600,00, trocar os pneus, manter o veículo limpo. Assim fica complicado trabalhar”, desabafou.

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Ramiro Cruz disse que já recebeu vídeo de motoristas autônomos se desfazendo de equipamentos do caminhão para poder pagar o diesel e completar a viagem

Ramiro Cruz Jr, QRA Pato de Borracha, há 34 anos na profissão, comenta que  um dos principais impactos do aumento do diesel é alta da inflação, já que tudo tem o custo do transporte e, portanto, são grandezas diretamente proporcionais. O fato reflete diretamente no bolso de todos os brasileiros através de preços altos de toda cadeia de produtos, serviços, alimentos etc.

Em relação aos motoristas autônomos, Ramiro acredita que o impacto é ainda mais direto e provoca uma queda no faturamento. “As empresas e os contratantes de frete não vão reajustar o valor na mesma medida. Isso já é prejuízo, pois resulta em menos renda ou até a falta dela, como aconteceu em 2018”, lembrou. Contou que já recebeu vídeos de vários motoristas vendendo caixa de ferramenta, caixa cozinha, se desfazendo de equipamentos, para completar o valor do diesel e finalizar a viagem. “A conta do combustível corresponde a 2/3 ou até mais do custo do deslocamento do caminhão. Portanto, se aumenta 15% deveria existir ao menos um reajuste na mesma porcentagem no preço do frete”, sugeriu.

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Sérgio Lopes disse que após o último aumento do diesel o custo de uma viagem entre o Interior de São Paulo e o Rio de Janeiro aumenta em até 300 reais

O carreteiro paulista de Amparo, Sérgio Lopes Almeida, 39 anos de idade e 17 de profissão, reforça o fato de os aumentos constantes do diesel trazerem instabilidade e redução na renda dos caminhoneiros autônomos. Ele disse que geralmente gasta entre 300 e 400 litros de diesel num carregamento de Amparo/SP até o Rio de Janeiro/RJ, dependendo do local da carga.  “Com o preço do litro a R$ 3,39 eu desembolsava de R$ 1200 a R$ 1.350,00, mas com o último aumento que elevou o preço médio do litro para R$ 4,00 ou mais, estou gastando R$ 1.600,00 para completar o tanque. O prejuízo é de R$ 300,00 por viagem”, lamentou.

Sérgio Lopes acrescenta que faz três viagens por semana e assim seu prejuízo está chegando a R$ 1.000,00. Se eu viajar quatro semanas por mês (12 viagens) o prejuízo é de R$ 4.000,00 praticamente o valor de uma parcela do caminhão”, desabafou.

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Jader Lopes

O também carreteiro Jader Lopes de Magalhães, 58 anos de idade e 30 de profissão, de Jacarepaguá/RJ, disse que a combinação das altas do diesel com a defasagem do frete tem levado muitos autônomos a mudar de profissão. “Eu mesmo tinha quatro caminhões leves rodando. Devido a essa situação de instabilidade hoje estou com apenas um, porque não estou obtendo retorno.  O valor do pedágio e do diesel estão muito altos, no final das viagens não sobra quase nada”, finalizou.