Os longos períodos de espera para carga e descarga lidera a lista de queixas dos motoristas de caminhão, principalmente por parte dos autônomos. Falhas no embarque ou no recebimento de mercadorias, leva profissionais a permanecerem horas na frente das empresas ou armazéns até serem liberados, resultando na perda de tempo e até recusa na contratação de outros fretes. Esse problema traz, entre outras consequências, redução de faturamento e aumento das despesas diárias com alimentação e estadia. Outro fator negativo é a falta de infraestrutura básica nos locais de carga e descarga para atendimento dos motoristas.

A lei nº 13.103/15 para atualizar a norma 11.442/07 e regulamentar procedimento de carga e descarga, e garantir ao motorista o direito de receber pelas horas excedentes de espera foi instituida em 2015.  O prazo máximo estipulado para a operação é de 5 (cinco) horas, contadas a partir da hora de chegada no local de procedência ou no destino da carga. Caso não seja respeitado o prazo, é devido ao Transportador Autônomo de Cargas (TAC) ou à Empresa de Transporte Rodoviário de Cargas (ETC), R$1,77 por tonelada/hora ou fração do tempo acima do permitido. Para o cálculo do valor da estadia será considerada a capacidade total de transporte do veículo.

O embarcador e o destinatário da carga são obrigados a fornecer ao transportador documento hábil que comprove o horário de chegada do caminhão nas dependências dos respectivos estabelecimentos, sob pena de serem punidos com multa a ser aplicada pela Agência Nacional de Transportes Terrestres – ANTT, que não excederá a 5% (cinco por cento) do valor da carga.

O assessor da Confederação Nacional dos Transportadores Autônomos (CNTA), Cleverson Kaimoto, alerta para a importância do motorista estar resguardado em relação à comprovação do horário de chegada ao estabelecimento. “A lei estabelece que o embarcador é obrigado a fornecer um documento ao transportador que comprove o horário de chegada do caminhoneiro. Porém, é importante que o motorista faça também a comunicação de um modo que comprove o horário da sua chegada. Essa informação pode ser transmitida, por exemplo, via WhatsApp.

No entendimento de Kaimoto, o principal inconveniente para se cumprir a lei é a falta de fiscalização. No entanto, esclarece que o motorista pode entrar com uma ação judicial para fazer valer seu direito de receber o valor da estadia. Caso esse documento de comprovação de horas de entrada e saída do motorista no estabelecimento para carregar ou descarregar não seja fornecido, cabe uma denúncia junto a Agência Nacional de Transporte Terrestre (ANTT) pelo telefone 166, e-mail: [email protected] ou pelo site: www.antt.gov.br na aba Fale Conosco.

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Poucas empresas oferecem infraestrutura para atender o motorista com segurança. A maioria não tem estacionamento e nem banheiros, afirma Odair de Oliveira

O carreteiro Odair de Oliveira, São Leopoldo/RS, tem cerca de 20 anos de estrada, e diz que são poucas as empresas que oferecem infraestrutura para receber o motorista com segurança. E mesmo com existência da lei de carga e descarga é muito difícil fazer cumpri-la. “A maioria dos locais não tem estacionamento. No Porto de Santos, por exemplo, temos de ficar na beira da rua e sem banheiro para higiene e o agendamento quase sempre não é cumprido. Hoje a lei prevê cinco horas para descarregar, porém, esse tempo nunca é respeitado. Os estacionamentos particulares cobram cerca de R$ 200,00, valor muito alto para nosso orçamento”, afirmou.

Odair ressalta que esse problema acontece também nos atacadões e mercados sem estacionamentos ou lugares seguros para a espera, deixando como opção aos motoristas estacionar na beira da pista. “Se você liga para a transportadora e avisa que ficou dois, três dias para descarregar, a resposta é que nada pode ser feito e que o agendamento foi passado pelo próprio estabelecimento. Se reclamamos sobre a diária corremos o risco de não carregar mais para aquela empresa”, explicou.

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Sérgio Marques de Almeida disse que já passou por muita humilhação ao lembrar de um carregamento agendado para descarregar às 8 horas mas só conseguiu sair do local às 21 horas

Sérgio Marques de Almeida, QRA Serginho Carioca, Petrópolis/RJ, 49 anos de idade e 30 de estrada, conta que já passou por muitas humilhações na hora de carregar ou descarregar. Cita como exemplo uma carga que consumiu sete horas somente com a parte burocrática de preenchimento de fichas. “Outro dia descarreguei em um mercado do Rio de Janeiro com agendamento para as 8h da manhã e sai de lá às 21h. A dificuldade maior é em relação a higienização e alimentação. Somos proibidos de utilizar a nossa caixa cozinha e somos obrigados a sair ou se sujeitar a comer o que eles oferecem”, lamentou.

O carreteiro acredita que apenas 5% das empresas realmente se preparam para atender os motoristas de caminhão. A maioria, opina, deixa os profissionais do lado de fora sem banheiro, sem torneira para higienizar as mãos em meio a pandemia e sem qualquer informação. “Muito humilhante. Estou há 30 anos na profissão e realmente é bem difícil encontrar um local que nos receba bem. Ás vezes estamos com a família e a humilhação é ainda maior”, afirmou.

Essa falta de respeito foi sentida também por Daielly Silvia Rodrigues, de Uberlândia/MG, a esposa de um caminhoneiro que preferiu não ser identificado. Em uma viagem em companhia do marido e a filha de cinco ano, para Monte Negro/RS, chegaram tarde da noite no local foram informados que deveriam esperar até o dia seguinte para descarregar rolos de fios. “No dia seguinte, chamaram meu marido para descarregar, avisaram que eu e minha filha teríamos de ficar do lado de fora, no estacionamento sob temperatura de 8 graus”.

A esposa do caminhoneiro disse ainda ter sido falta de respeito e de humanidade por se tratar de uma criança, que passou frio mesmo agasalhada. “Minha indignação foi ainda maior quando percebi que na portaria havia uma salinha vazia, mas não pudemos entrar. Eu só queira proteger a minha filha do frio”, relatou.

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Em Curitiba/PR, é preciso pagar para tirar autorização de descarga e indicar o tempo da operação, disse Domingos Antenor, que trabalha com transporte de mudanças

O carreteiro Domingos Antenor Felicetti, de Curitiba/PR, 63 anos de idade e mais de 390 com caminhão, transporta mudança em rotas de curtas distâncias. Ele também convive com o problema de carga e descarga de mercadorias. “Para fazer a mudança aqui em Curitiba tem de tirar uma autorização para descarregar. A não ser que no local tenha placa e faixa exclusiva para este trabalho. Nessa autorização é necessário estipular o período, e pagamos por isso. Caso o motorista extrapole o tempo recebe multa. Não existe a possibilidade de fazer outra autorização ou aumentar o tempo. Na minha opinião isso é errado. Deveríamos pagar apenas pelo tempo utilizado no serviço, mas isso não acontece”, reclamou.

COMO EVITAR PROBLEMAS

A desorganização das empresas é um dos principais motivos desse tipo de situação. Entretanto, algumas atitudes por parte dos motoristas podem contribuir para evitar esse tipo de transtorno.

O primeiro passo é fazer um planejamento e se informar com antecedência sobre os detalhes do serviço. Isso incluir saber sobre o local da coleta e da entrega. Horário de funcionamento e se existe a possibilidade de agendamento. Outro ponto importante é pesquisar se a empresa disponibiliza sala de espera com estrutura para atender o motorista.

Vale também uma análise do local onde está situada a empresa e se nas proximidades tem segurança para estacionar o caminhão. Após fazer essa verificação, evitar atraso e, se possível, chegar antes do horário determinado. É importante também checar as restrições de circulação do local de entrega ou retirada da carga. Outro ponto importante é estar atento aos horários de maior movimento no trânsito na rota e se existe nas ruas próximas aos locais há condições de circular ou manobrar o caminhão.